− Mãe, eu tô com medo! – o menino de
cinco anos estava parado na soleira da porta que ligava o corredor da casa à
sala.
− Medo do quê,
filho? – a mãe, assim como o pai, sentados no sofá, assistiam ao programa de
domingo à noite. Olhos pregados na TV.
− Do bicho.
− Que bicho, meu
filho? Seu quarto está limpinho, não tem bicho nenhum lá.
− Não, mãe, não é
esse bicho... É um monstro que...
− Filho, papai e
mamãe estão vendo o programa. Fica quietinho. – cortou o pai, sem olhar pro
garoto.
− Mas pai, o bicho
vai...
Finalmente o pai
se vira pro garoto. E ele sabia que o pai só fazia isso quando estava chateado.
− O bicho não vai
nada porque não existe bicho nenhum. Vai brincar lá no seu quarto e deixa a
gente assistir.
− Mas eu vi o
bicho no tablet. É grande. Ele ataca gente. É um bicho monstruoso!
− Eu disse que
tinha que bloquear o acesso desse menino na Internet.
− E você acha que
adianta? Essas crianças já nascem sabendo mexer em tudo dessas coisas.
− Então você devia
ficar de olho. Passa o dia inteiro com ele.
− Por que você não
fica de olho também? Por que eu é que tenho sempre que ser a chata?
− Porque eu tenho
que trabalhar pra comprar TV grande pra sala e tablet pro moleque.
− Hum! Bem que eu
queria trabalhar também. Não vou porque não deixam.
− Não vai começar
com isso de novo! Não vem com esse papinho feminista que na minha casa não tem
disso não.
− Papinho
feminista? Você me prende dentro de casa o dia inteiro, a vida inteira e acha
que eu querer ter um pouco de liberdade, ter uma vida social, colegas de
trabalho, uma renda a mais, tudo isso é movimento feminista?
− E não é? Você tem uma casa com tudo, tem um
filho pra cuidar, um marido que te garante uma vida boa, quer ficar na rua
batendo perna pra quê? Pra se juntar com aquelas amigas mal comidas que só
sabem ficar falando mal de homem.
− Pai! Mãe! Vão brigar de novo?
− A mamãe não está brigando com o papai. A
gente só está conversando.
− É . Conversando
assunto que não interessa e perdendo o programa.
− Vocês não podem
ficar comigo lá no quarto? Eu tô com medo.
− Não tem do que
ter medo! Vai lá brincar com suas coisas!
− Mas o bicho... O
bicho monstruoso...
O pai perdeu a
paciência.
− Ninguém vai
ficar no quarto com você. Se quiser companhia, vem pra sala e fica com a gente.
Mas fica em silêncio que eu quero ver o programa!
O menino abaixou a
cabeça, percorreu o corredor e entrou no quarto. Olhinhos assustados, carinha
desesperada que sempre se vê em quem tenta avisar as pessoas de alguma coisa
importante e não é ouvido. Sentou-se à mesinha que o avô tinha dado pra ele, pegou
o tablet e não se mexeu mais dali. Nem mesmo quando começou a ouvir o som
medonho como um rugido e os gritos na sala. Ficou quietinho e só saiu do quarto
horas depois, retirado por uma assistente social enquanto a polícia, que tinha
sido chamada por um vizinho, analisava o que não conseguia chamar de “cena do
crime”. Não parecia coisa de um criminoso. Os dois corpos na sala estavam
dilacerados, pedaços espalhados por toda parte. Parecia que tinham sido
estraçalhados por algum animal. Os policiais não conseguiam entender como teria entrado e
saído, já que tudo estava trancado, mas não tinham dúvida de que as mortes
tinham sido causadas por um bicho. Um bicho bem grande. Na verdade, um bicho
monstruoso!
O menino tentou
avisar.
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